Dentre os vários meios de comunicação que nos deparamos na atualidade, uma das formas de criar críticas é a charge,  uma vez que nelas encontramos empregados argumentos satíricos, irônicos e deboches.  Fato esse que leva o leitor a aceitar as ideias apresentadas nas tiras e o persuadir por meio de argumentos lógicos que possam o convencer. 

Em estudos filosóficos feitos por Thomas  Hobbes  (1588), o autor afirma que a ironia já se encontrava presente na Idade Média e no Renascimento. Do mesmo modo, Aristóteles diz que a alegria era passada por meio da ironia, zombaria e desprezo. Pesquisas feitas por Georges Minois (2003, p. 19), conceitua que o irônico consiste no auto-aniquilamento de tudo o que é soberano: 

(...)  o  riso  esconde  o  seu  mistério,  às  vezes,  agressivo,  sarcástico,  angélico,  tomando  as  formas  da  ironia,  do  humor,  do  burlesco  e  do  grotesco.  O  riso  é  multiforme  e  ambíguo:  expressa  tanto  a  alegria  pura  quanto  o  triunfo  maldoso,  o  orgulho  ou  a  simpatia  (MINOIS,  2003,  p.  19-20).

Assim podemos entender que o riso provocado pelas charges representa fatos políticos e acontecimentos sociais. A sátira pode ser entendida como uma banalização de fatos corriqueiros que acontecem na política e na sociedade. Segundo Maringoni (1996, p. 85), “a sátira, o comentário e a banalização dos fatos cotidianos e da política nacional fazem parte da prática do chargista”.

A produção da charge tem a ver com a necessidade do ser humano de criticar o sistema político e o poder econômico. Conforme destaca Silva (2004):

O  termo  charge  é  francês,  vem  de  charger,  carregar,  exagerar  e  até  mesmo atacar violentamente (uma carga de cavalaria). Este tipo de texto tem  caráter  temporal,  pois  trata  do  fato  do  dia.  Dentro  da  terminologia  do  desenho  de  humor  pode-se  destacar,  além  da  charge,  o  cartum  (satiriza   um   fato   específico   de   conhecimento   público   de   caráter   atemporal),  a  tira,  os  quadrinhos  e  a  caricatura  pessoal.  A  charge  será  alvo do estudo por trazer, em uma análise superficial, implícita a história e  a  presença  do  interdiscurso.  Ela  é  o  local  escolhido  pela  ironia,  metáfora  (transferência),  pelo  contexto,  pelo  sujeito,  para  atuar.  Por  ser  combativa,  tem  lugar  de  destaque  em  jornais,  revistas  e  na  Internet.  Portanto, ampla poderá ser a leitura interpretativa por nela se constatar a presença da linguagem, da história e da ideologia (SILVA, 2004, p. 13).

Entendemos assim que a caricatura foi um dos primeiros recursos a ser usado para fazer críticas, uma vez que ela tem relação com a história e a memória das pessoas. Para que o leitor entenda a charge é preciso que ele tenha uma memória social sobre o acontecimento exposto na charge e que essas lembranças possibilite a formação de sentido para o discurso.

A charge pode se enquadrar em vários conceitos conhecidos dentro dos discursos de linguagem, um deles é a política. Charaudeau (2013), define o discurso político com um duplo fundamento: ação e linguagem. Para tanto, esse discurso funciona como uma conjunção de ideais, possuindo verdades e possibilidades. Assim como toda comunicação possui o fundamento de comunicar, o discurso político também possui estratégias, que para  Charaudeau (2013), “todo político sabe que lhe é impossível dizer tudo a todo momento e dizer as coisas exatamente como ele as pensa ou as percebes, pois não é preciso que suas palavras entravem sua ação".

Para a construção de uma charge, são levados em consideração várias estratégias de discurso que tem por finalidade possui um efeito humorístico, reflexivo e cômico.  Por assim a dizer, a charge só é engraçada para quem consegue identificar o humor dentro dela. E para isso é preciso utilizar recursos linguísticos da imaginação, bem como ter capacidade para conseguir identificar os temas políticos que existem dentro da charge, através do espaço-temporal e contexto histórico ao qual está inserida.

Passamos agora a analisar nossa primeira charge política: o Ridículo. Priscila Silva (2014) apresenta a charge política como um   “humor ridicularizante”. Para ela “o ridículo se constrói como elemento de piada, capaz de demonstrar também alguma hostilidade em contraste à graciosidade do senso de humor” (p. 06) . As charges procuram figuras públicas para serem inspiradas e produzidas, se atém aos defeitos e erros cometidos por esses personagens e, assim, provocam riso por meio da ridicularização.

Na sequência, analisemos a intertextualidade. Podemos entender que a charge não é autoexplicativa e por isso é necessário que se faça uma contextualização sobre o momento em que ela foi desenhada. Para tanto, é preciso que o leitor já possua um entendimento próprio do assunto para que possa compreender melhor. Kleiman (2004[1989]) define o conhecimento prévio em três tipos. São eles: o conhecimento linguístico, o conhecimento de mundo e o conhecimento textual.

O conhecimento linguístico é definido por Kleiman (2004[1989]) como a capacidade de comunicar-se em diferentes idiomas; já o conhecimento de mundo são as diferentes capacidades e formas de informar-se sobre s um assunto; por fim o conhecimento textual está ligado a conhecimentos linguísticos que faz com que o leitor possa reconhecer um gênero.

E, por fim, analisemos a linguagem visual, que trata sobre os elementos que fazem parte da estrutura básica sobre a imagem em que o texto se baseia. Por isso, nenhum dos assuntos em que se estrutura uma charge deve ser analisado de forma isolada, devendo assim possuir um significado explicito. 

A parte visual da charge é muito usada em impressões que são produzidas por ilustradores. Enquanto o texto apresenta a parte verbal, a charge representa o elemento não-verbal, trazendo em sua composição caricaturas, cenário e, como complementa Cavalcanti (2008), “pelos balões de fala, os quais, de acordo com sua forma, podem representar fala, grito, pensamento, cochicho, etc.” (p. 12).


Autor: Luciano Alves


REFERÊNCIAS

CAVALCANTI, M. C. C. Multimodalidade e Argumentação na Charge. Recife,

2008.

CHARAUDEAU, P. Discurso das mídias. Traduzido por Ângela S. M. Corrêa. São

Paulo: Ed. Contexto, 2006b

KLEIMAN, A. Leitura: ensino e pesquisa. 2 ed. Campinas:Ed. Pontes, 2004[1989].

MINOIS, G. História do Riso e do Escárnio. Editora da UNESP, 2003 

SILVA, P. C. D. Estratégias de humor crítico na produção de charges políticase contribuições para o ensino de gêneros textuais e discursivos. UNIFEI, 2014.

SILVA, R. V. M. Tradição gramatical e gramática tradicional: fundamentos da gramática tradicional; leitura crítica das gramáticas escolares; análise da sintaxe do português. SP: Ed. Contexto, 1997.

SILVA, Carla Letuza Moreira e. O trabalho com charges na sala de aula. Pelotas, RGS: UFRGS, 2004.


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